Análise dos pressupostos implícitos na concepção do Plano funcional do futuro Hospital de Todos os Santos (HTS) e na desactivação do Hospital de D. Estefânia (HDE).
O princípio utilizado para justificar a implantação do HTS "Fomentar a centralização e partilha de recursos", é um conceito genérico abstracto apropriado a qualquer gestão de meios parcimoniosa e inteligente. Este princípio contudo quando é hiper valorizado e descontextualizado de uma visão de uma carta de serviços hospitalares, pode, como se prevê no HTS, transformar-se num instrumento de retrocesso cientifico e assistencial.
Consideramos que a visão que presidiu a criação do plano do futuro HTS nomeadamente no que diz respeito a prestação de cuidados em Pediatria ser extremamente redutora. O HTS foi constrangido na sua idealização por uma concepção puramente economicista que justifica a centralização de todos os recursos humanos, equipamentos e físicos com vista para alcançar a sua exploração intensiva e não com o intuito mais nobre de aprofundar a excelência na prestação de cuidados que ao contrario implica diferenciação de competências. A opção por este tipo de concepção retira ao cidadão comum um serviço que tem naturalmente tem direito, ao mesmo tempo que implica num favorecimento da parceria privada através de lucros directos ou indirectos.
A aplicação do conceito de centralização de meios humanos , físicos e técnicos justifica-se apenas até o patamar dos hospitais distritais tornando-se acima deste patamar absurda
Os Hospitais Pediátricos surgiram naturalmente com a evolução na diferenciação de cuidados pediátricos especializados e são hoje parte necessária e imprescindível dos equipamentos das grandes centros e capitais que recebem a massa critica assistencial das regiões envolventes. Estes hospitais são imprescindíveis não só ao nível assistencial, mas igualmente como formadores de competências em todas as especialidades que hoje fazem parte da pediatria. O Hospital D. Estefânia exemplifica este papel pois tem sido uma grande escola e é criador de competências medico cirúrgicas em pediatria para o todo o Pais.
Reiteremos que este conceito quando aplicado como filosofia estruturante aos Hospitais Centrais terciários torna-se absurda, pois simplifica ao mínimo denominador comum, a era da pré diferenciação profissional na área da saúde do século XIX.
A perspectiva centralizadora do futuro HTS e suas consequências devastadoras na qualidade da assistência médica infantil estão escandalosamente á manifesto, pois entre as especializações pediátricas previstas, resumem-se as do inicio século passado: apenas a cirúrgica e a médica . Todas as outras criadas e desenvolvidas no hospital H.D.E. ao longo de sua existência estarão diluídas e integradas nos Serviços de adultos.
O projecto HDS aparentemente com capa de moderno é essencialmente ultrapassado e retrógrado, pois se aliena propositadamente do progresso necessário que constitui um Hospital Pediátrico especializado.
O plano funcional do HDS idealizado por gestores insensíveis para a importância e conhecimento da diferenciação em todas as áreas do conhecimento em pediatria, parece ignorar em particular que a qualidade da assistência médica infantil tem um importante papel como criadora de riqueza e motor de progresso pois de si depende o que é mais precioso á nação, o futuro de suas crianças.
Esta visão infelizmente apenas adopta a óptica de obtenção do lucro máximo com a maior economia de meios possível. Concebe os Hospitais apenas como fabricas de tratar doentes. Ignoram o conceito actual de que "Os hospitais devem ser construídos para servir os Cidadãos e não para rentabilizar a sua actividade e dar lucro através da saúde dos cidadãos"
Não é portanto difícil intuir, face a percepção de tais factos, deduzir porque o Sector privado emergente está interessado e activamente aplicado na destruição do sector publico.
Seria útil que estes senhores se apercebessem que sem a excelência no Serviço Publico não pode existir excelência no sector privado. Nos países do 1º mundo a evolução tecnológica decorre da interacção inteligente entre eles estes dois espaços. Os Hospitais Pediátricos investigam e distribuem conhecimento passível de comercialização em várias áreas do saber. A percepção de tais factos levam-nos a concluir que sem a existência de um Serviço Hospitalar Publico, não é viável a formação de competências técnicas, adaptadas ao nosso contexto, para suprirem com qualidade, os quadros técnicos do Serviço Médico no Sector privado.
Os defensores do plano funcional do HTS de forma abstracta, acenam com a super especialização em áreas cirúrgicas especificas e com a implementação de alta tecnologia . Esquecem-se que os Serviços e as respectivas especialidades que justificam estas técnicas fornecendo-lhes substrato e possibilidade de seguimento, foram destruídos ou destituídos de sua autonomia. A capacidade de criação e avanço cientifico, que um Hospital Pediátrico com enfoque diversificado e integrado pode propiciar esvane-se com a destruição de sua autonomia.
Propalam dentro de uma visão economicista, que esquece o doente e demais realidades tratar-se dum Hospital de Ponta, orientado para a cirurgia, ambulatório e a doença aguda, com uma rotação rápida de camas. Preocupam-se exclusivamente com o tempo de internamento (um mal a evitar mas ainda incontornável) pois é este que encarece o orçamento hospitalar. Assim em função custo, os cuidados continuados e a doença crónica não são considerados. Esta atitude implicitamente desfavorece a fracção de nossa população com menor nível cultural ou económico, pois não tem possibilidade de prestarem estes cuidados em suas casas.
Sem serviço publico, não esta garantida em igualdade de condições, a equidade da prestação de Serviço Médico a todas as crianças. Esta condição implica em fracturas sociais que põe em causa a existência da própria comunidade e em ultima instância até o sector privado.
Enfatizamos as acções em que transparecem ser sua política apenas de fundo económico :
•Definem para o HTS uma actuação indiferenciada. Reservam em particular para os Serviços Pediátricos, um espaço de acção amplo, intercomunicável apoiado numa multidisciplinaridade versátil, com isto intentam rentabilizar o espaço, os equipamentos e os funcionários. Desconsideram assim todos os óbices supra-citados.
•Aligeiram este plano redutor no que diz respeito a pediatria com criações de circuitos distintos para os utentes pediátricos mas que são arquitectonicamente irrealizáveis e dão o nome de "ambiente pediátrico" as meias paredes de separação ou biombos.
Infelizmente, não pensam na economia para criar riqueza mas apenas para arrecadar. Não estão realmente preocupados com nossas crianças, o seu objectivo é rentabilização, centralização e a partilha dos recursos humanos e técnicos a qualquer custo com vista a apresentarem números.
Ao destruir de forma activa e planeada o histórico Hospital Pediátrico de Lisboa (HDE), não se apercebem do total da perda em valor social. Na pior conjectura os indícios sejam que talvez apenas pensem em capitalizar estes valores em beneficio próprio.
Assina Pedro Paulo Mendes
Nota editorial >
Este texto reflecte apenas a opinião pessoal do signatário . Relembramos assim que dentro dos pressupostos do Manifesto da Plataforma para defesa do HDE existe espaço para interpretações e opiniões variadas Consideramos importante a sua publicação ainda por o considerarmos passível de gerar polémica e assim esclarecimento.
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2 comentários:
Concordo com a critica generica ao plano funcional mas a questão da preonderancia da componente cirurgica do HTS sobre a médica não me parece adequada. De facto o paradigma de que um bom serrviço é o que tem muitas camas e como tal quanto mais camas melhor serviço já foi há muito ultrapassado, de resto como se pode observar nos melhores hospitais pediátricos. Quanto ao ambiente pediátrico dever ser assegurdo por biombos ou meias paredes é de tal modo ridiculo que não é possivel que alguem na posse das normais capacidades de discernimento o possa ter proposto. Mas e se os "consultores" que elboraram a proposta se limitaram a obedecer ás directrizes superiores de quem lhes encomendou e "pagou" o serviço dizendo claramente que a encomenda não era de um hospital geral mais um pediátrico mas antes um unico hospital geral, a quem atribuir as culpas...
John Hunter
É uma boa resposta à pergunta que já me fizeram. Redireccionei para este post.
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