quarta-feira, 26 de março de 2008

.... Este é um espaço de discussão..

Enviaram-nos um texto com autor identificado.
Agradecemos e o publicamos, pois consideramos que só a exposição clara e franca de pontos de vista diversos e mesmo eventualmente contraditórios aos nossos, levarão a sínteses mais abrangentes.
Acreditamos assim na necessidade de uma informação plena e na capacidade de cada um em formar a sua opinião em livre arbítrio sem qualquer condicionamento de informação.
Leiam-no com atenção e enviem as vossas considerações!




Qual o futuro de um Hospital Materno-Infantil no mundo dos “grandes”?

É consensual que o objectivo de qualquer Hospital Público consiste em garantir a equidade do acesso a cuidados especializados de qualidade, humanizados e inovadores, numa lógica de investimento racional, e que esse objectivo encontra-se claramente expresso na missão do Hospital materno infantil de Dona Estefânia, que integra o recém criado CHLC.
A sua Missão é : “Prestar cuidados de saúde diferenciados e de elevada qualidade à Criança e à Mulher, assegurando a formação pré-graduada e pós-graduada de acordo com padrões da mais elevada qualidade e promovendo a investigação, … facilitando a acessibilidade aos seus recursos e o desenvolvimento de complementaridades e parecerias no interesse dos Doentes”.
Se os objectivos estão definidos, a procura da qualidade e da inovação devem hoje passar pelo estabelecimento de parecerias e complementaridades de modo a potenciar quer o desenvolvimento de novas metodologias e tecnologias, quer a partilha de experiências, no interesse último dos próprios Doentes.
A longa história do HDE que desde a sua fundação em 1877 o vocacionou para o tratamento da Criança e da Mãe, tornou-o num dos primeiros hospitais materno-infantis a ser construído na Europa, permitindo que ali se desenvolvessem varias inovações quer organizacionais, como a separação clara do modelo de cuidados pediátricos entre cuidados médicos e cirúrgicos (ocorrida em 1918), quer tecnológicos como seja a criação pioneira de unidades de cuidados intensivos neonatais e pediátricas, a criação da primeira unidade de queimados pediátricos do País, ou ainda investindo em métodos e técnicas adequadas a cada grupo etário que permitiram o desenvolvimento de sub-especialidades na área da Pediatria, tornando este Hospital um centro de formação pós-graduada de referência nacional e internacional.
Este longo caminho percorrido durante 130 anos, caracterizado por um ambiente multidisciplinar dedicado aos cuidados materno-infantis, traduziu-se sempre numa melhoria significativa dos ganhos em saúde para as crianças portuguesas, produzindo entre outros indicadores de todos conhecidos, uma mortalidade igual ou inferior à observada em outros centros europeus para os doentes recém nascidos portadores de malformações graves ou de extrema prematuridade ou nos grandes queimados pediátricos.
A experiência acumulada foi sendo partilhada, numa lógica hipocrática de ensino, promovendo a formação de inúmeros Especialistas que criaram novos Serviços em todo o País, colocando Portugal num dos lugares cimeiros no ranking mundial dos cuidados materno-infantis.
Para se manter esta qualidade nos resultados foi necessário criar uma “massa crítica” de profissionais e de casos que, como vários estudos demonstraram, leva a uma relação directa entre o volume de actividade e a qualidade dos resultados obtidos, especialmente no campo dos doentes mais graves ou de patologia mais complexa.
A recente reestruturação da malha hospitalar de Lisboa, com a constituição do CHLC no qual o HDE foi integrado, levará a breve prazo à construção do Hospital de Todos os Santos que, nas palavras do Dr. Correia de Campos, deverá “...substituir e racionalizar uma oferta de cuidados que actualmente é assegurada por um conjunto de velhos hospitais, por uma oferta moderna e eficiente, de excelência, que dignifique ainda mais o nosso SNS, tornando-o moderno, flexível e ajustado às necessidades de cuidados de saúde dos cidadãos da cidade e da sua área de atracção secundária e terciária.”
Por quanto foi dito acima a questão de fundo do debate que percorre transversalmente os profissionais de saúde do HDE é, se com esta concentração de hospitais num único espaço será possível manter a autonomia e as especificidades dos cuidados materno-infantiis ou, se pelo contrário, vai haver uma adulteração deste modelo de cuidados.
Pessoalmente, acredito que esta racionalização / concentração de meios irá certamente conduzir ao ”…estabelecimento de parcerias e complementaridades…” permitindo elevar em muito o patamar tecnológico e a oferta de cuidados altamente diferenciados com que todos os nossos Doentes vão beneficiar.
A qualidade do actual modelo de cuidados só será mantida e amplificada se mantivermos a “massa crítica” de Doentes graves e complexos que ao HDE acorrem, quer espontaneamente, quer por referência de outros centros. Este facto torna assim importante e urgente, a definição clara pela tutela de uma verdadeira rede de referência secundária e terciária, que leve a que esses Doentes devam apenas ser tratados onde existem os meios mais adequados e os profissionais treinados para garantir o melhor resultado ajustado ao risco.
Acredito também que o que faz um Hospital Materno-Infantil não são os bonecos mais ou menos coloridos que se pintam nas paredes e nas batas, mas antes um modo “especial” de cuidar e de estar na prática clínica. A evolução recente dos conceitos de arquitectura hospitalar e design de hospitais pode certamente responder à necessidade de manutenção de um “ambiente” pediátrico específico e autónomo, protegendo devidamente a “contaminação” dos cuidados a prestar às crianças e às mães, por parte daqueles que, para tal não se sentem vocacionados ou não estejam habilitados.
Assim atrevo-me a enunciar os valores que devem presidir à integração funcional, que não apenas física “strictu-senso”, de um hospital materno-infantil num centro hospitalar moderno e de elevada concentração tecnológica como se prevê ser o HTS :
1. O primado do Doente e da sua Família, que não poderá ser posto em causa por quaisquer outros interesses.
2. O primado do tratamento do Doente sobre o tratamento das doenças, em ambiente adequado às suas necessidades, promovendo a concentração de recursos e competências numa lógica de processos adequados às necessidades de cada grupo etário.
3. A procura permanente de colaboração e coordenação com os restantes Departamentos e Unidades do CHLC de modo a oferecer o melhor e mais adequado modelo de cuidados a cada Doente.
Salvaguardados estes valores, a manutenção do modelo de cuidados que ao longo dos anos foi desenvolvido e aperfeiçoado no HDE, estará certamente assegurado, tornando suficientemente explícito a todos que este modelo não poderá ser “adaptado” sem o desvirtuar, devendo manter a sua autonomia nas decisões técnicas, influenciando positivamente as decisões de gestão.
Assinado

quinta-feira, 6 de março de 2008

Hospital de Todos o Santos - Opiniões sobre o Plano Funcional


Uma primeira impressão do Plano Funcional do futuro Hospital de Todos os Santos:


Era minha hora do almoço, e decidi aproveitá-la para analisar o Plano Funcional do futuro Hospital de todos os Santos.
Antes telefono à Secretaria do C.A. para saber da oportunidade, pois julgava que o Conselho de Administração ainda se reunia lá às 4ªs feiras. Informam-me delicadamente que não haveria problema, pois agora as reuniões eram todas no Hospital de São José!
O Hospital de D. Estefânia de facto já deixou de ser um Hospital Pediátrico dedicado para certos sectores administrativos... A sua Direcção já se localiza no Hospital de Adultos, e é de lá que emanam as “ordens”...
Pouco depois, já no C.A, entregam-me os dois Dossiers com cerca de 200 páginas cada um.
Inicialmente, procuro inteirar-me dos autores do projecto e da metodologia da sua selecção. Encontro como explicação e pista a palavra "InterSalus", empresa que soube através da Net, estar sedeada em Barcelona.
Indago-me por qualquer indício dos planos terem sido realizados segundo pareceres de entidades competentes na área da saúde materno infantil em Portugal. Mas se o foram, nada é referido no documento.
Seria cínico da minha parte indagar se algum médico do Hospital D. Estefânia, ou mesmo dos outros Hospitais do Centro Hospitalar, chegou a ser ao menos consultado?
O projecto é assim omisso a qualquer concurso que justificou e a sua selecção... A palavra "Pediatrico" encontra-se “perdida” em vários paragrafos do indice de um Hospital Generalista.....
Invade-me a sensação de perda de tempo e enovelamento em inúmeras páginas administrativas feitas provavelmente por encomenda a uma empresa “especializada” em projectos hospitalares.
Após uma hora, reserva-me uma surpresa desoladora, pois apenas ao final do livro aparece um capítulo que não constava do índice! Este denomina-se “O ambiente Pediátrico”, e é uma adenda evidentemente ali “colada” a posteriori, como que por necessidade de uma justificação. Um complemento “sem jeito”, que lembra um auto-convidado para uma festa em que não era esperado, e sua entrada é permitido apenas pela porta traseira, sendo avergonhadamente escondido, não merecendo referência alguma no índice principal...
Cansado e desiludido pouso os dossiers sobre a mesa. Estive a perder tempo infrutiferamente...
Despeço-me com a sensação de frustração único tema que me interessava analisar fora e remetido a um anexo “sem eira nem beira”, que eu encontrara por mero acaso ao, inadvertidamente, ter eu resolvido ir até as traseiras do livro!
Já no caminho de volta ao meu Serviço, ressoam-me as frias palavras do ex-Ministro à TVI, algumas horas antes de se demitir:
- Tenho muita pena, mas o Hospital Dona Estefânia é mesmo para se fechar...
Associação de palavras e sensações, pois as do ex-Ministro estavam em perfeita sintonia com o frio e desabitado ambiente da Sala do Conselho de a Administração às 4ªs feiras. Mas, nem tudo é desolação, pois como vimos o então Ministro enganou-se... Quem aparentemente “Fechou” foi o Ex-Ministro, e apenas algumas horas depois de te-lo afirmado! Coincidência?!!!
Dissemos aparentemente pois segundo consta os "actuais planos " ou planos obscuros " pois no que diz respeito a Pediatria não estão publicados, e são para continuar...
O 1º round já está ganho pelas Crianças de Portugal e a sua “Arca de Noé” que já carrega 75.000 assinaturas ao Presidente da Republica Portuguesa!

E a Arca de Noé apenas começou a navegar!


Transcrevemos abaixo outro artigo de opinião, já publicado no Blog, sobre o Plano Funcional, para permitir aos leitores uma perspectiva de conjunto.
Se estiveres em desacordo com estas perspectivas envia a tua opinião que a publicaremos.

Sobre o Plano Funcional para o futuro Hosp. de Todos os Santos :

em>"Preocupa-nos" que:

-A assistência à criança passe a ser feita, regressando ao passado, por profissionais sem formação especifica no atendimento e tratamento de bebes e crianças.

- Este documento retrate um Hospital Geral de Adultos, tendo sido colocados como anexos, ou em parágrafos acrescentados, apenas algumas referências à assistência à criança ( em espaços que sobram nas unidades de adultos)

- As reflexões e indicações previamente enviadas aos decisores, por parte do corpo técnico do Hospital, na sua maioria voltadas à criança, tenham sido ignoradas e substituídas por conceitos gestionários, que não contemplam a condição da criança doente nem de suas famílias.

- As áreas fundamentais de tratamento da criança estejam programadas para ser integradas em enfermarias de adultos, nomeadamente com doenças psiquiátricas. Mais estranho é quando, actualmente, hospitais com bons serviços de psiquiatria de adultos, enviam as suas crianças e adolescentes para internamento psiquiátrico em espaço próprio no Hospital de Dona Estefânia.

- Se queira destruir um hospital pediátrico de 200 camas, e reduzi-lo a um piso, ou andar num edifício basicamente preparado para doentes adultos.

- O modelo de assistência pediátrica do hospital pediátrico especializado e de apoio perinatal de Dona Estefânia, desenvolvido ao longo de mais de 130 anos, vá se assemelhar ao modelo de um andar destinado à pediatria, tal qual o que existe nos hospitais gerais das zonas mais afastadas como o da Amadora, Almada ou Vila Franca.

- Em outros países os grandes hospitais universitários que foram construídos nesse modelo dos anos 70 (o mesmo que agora querem nos impor em Portugal) estejam já reconsiderando a evidente vantagem de sua separação física em edifícios diferentes para as áreas de assistência à criança, ao adolescente e à mulher grávida."



Sobre o Internamento:

"Preocupa-nos que:

- Toda a pediatria médica e cirúrgica que no actual HDE tem cerca de 144 camas, passe a ser espremida em 44 camas "multi-especialidades", colocadas em quartos duplos.

- Recobros pós-cirúrgicos sejam feitos em conjunto com adultos, separados apenas por divisórias removíveis, acrescentadas ao plano de arquitectura base do novo hospital geral."



Sobre a Consulta externa:

"Preocupa-nos que:

- Estejam previstos apenas 10 gabinetes de pediatria, menos de 1/3 dos actuais.

- Não estejam previstos quaisquer gabinetes de consulta para as mais de 15 especialidades dedicadas à criança, que já hoje existem no Hospital D.Estefânia.

- Não esteja prevista a autonomia e especificação pediátrica de unidades diferenciadas no tratamento da criança como endocrinologia, nefrologia, desenvolvimento da criança, pneumologia, hematologia, ortopedia, neurocirurgia, urologia, oftalmologia, cirurgia plástica, estomatologia, entre outras. Ficando estas unidades como meros apêndices das unidades de adultos, subordinadas às técnicas e chefia de técnicos de adultos do futuro hospital de Todos os Santos. Retroceder-se-á com isso por décadas na qualidade do atendimento hospitalar da saúde infantil.


- As salas de técnicas diagnosticas sejam mistas com crianças e adultos, alguns muitos idosos e com situações susceptíveis de impressionar as crianças.

- Não existam instalações dedicadas às doenças infecciosas das criança, desconhecendo-se se irão partilhar com adultos as salas de isolamento, uma vez que apenas 4 camas estarão dedicadas para as crianças.


- As especialidades chamadas verticais, como a alergologia, genética, fisiatria, ORL, audiologia, etc, (que no actual hospital pediátrico de Dona Estefânia tem a sua actividade mais de 90% dedicada à criança), não tenham programados espaços para a criança, e regridam à mesma condição dos anos 50 do século passado, com a observação das crianças em espaços partilhados com adultos, numa lógica de "rentabilização" comercial de espaços e equipamentos.

- Nos casos em que o documento em análise ressalva a condição da criança no novo hospital, praticamente só seja feita referência à existência de sanitários para crianças e algumas separações dos adultos através de instalação de tabiques ou divisórias removíveis. Esta é, na essência, a forma como a arquitectura do novo Hospital de Todos os Santos se prepara para garantir a criação de um "ambiente pediátrico" protector e adaptado à criança.
"


Sobre a Fisiatria:

"Preocupa-nos que:

- A Fisiatria e reabilitação das crianças com deficiência passe a ser feita em 1/3 dos postos-gabinetes actuais.

- Os bebes e crianças portadores de anomalias físicas e do desenvolvimento passarão a fazer a sua reabilitação e em áreas e ginásios mistos com adultos
."


Sobre o Quadro Pessoal:

"Preocupa-nos que:

- O quadro de pessoal seja dimensionada para 1/3 das camas actuais, e que muitas unidades com capacidade de tratamento de crianças tenham que encerrar, ou não mais se possam desenvolver, por ausência de pessoal que faça a sua aprendizagem demorada na aplicação de novos métodos terapêuticos, e que sejam os médicos de adultos que tenham de estender a sua acção ao atendimento das crianças, por falta objectiva de profissionais preparados para o atendimento dos grupos etários mais jovens.


-As camas dedicadas à criança possam ser aumentadas até ao dobro em época de crise - situação mais que previsível - e à custa da montagem de mais camas em cada quarto com redução das condições de acompanhamento dos pais, com maior risco de infecção hospitalar e com sobrecarga imposta aos profissionais, contabilizando ratios de atendimento e risco intoleráveis."