domingo, 3 de setembro de 2017

Dias 28 e 29 de Setembro -Congresso Multidisciplinar de Comemoração dos 140 Anos do Hospital D. Estefânia : Leiam a transcrição integral do texto do Presidente do Congresso o Professor Dr. João Videira do Amaral sobre a Historia e importância dos Hospitais Pediatricos - Inscrevam-se .

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MENSAGEM DE BOAS VINDAS




O Congresso Multiprofissional do Hospital de Dona Estefânia, integra-se nas comemorações dos 140 anos da inauguração do primeiro hospital pediátrico do País, a 17 de julho de 1877.
Muito embora seja um Congresso científico comemorativo da importância científica do Hospital de Dona Estefânia enquanto espaço de formação de inúmeros profissionais, pretendemos que o Congresso seja também uma forma de promover e valorizar a criança enquanto representante de um futuro comum.
É nosso entendimento que todos os profissionais que se dedicam á criança partilham uma mesma dedicação na promoção da saúde e felicidade da criança e da família, e daí a naturalidade da inclusão, neste Congresso de todas as áreas profissionais do Hospital de Dona Estefânia.
Para além disso sentimos igualmente, como nossos colegas e amigos, todos os que incorporam a saúde infanto-juvenil como um espaço comum de desenvolvimento e estamos seguros que a partilha de diferentes saberes, técnicos e sociais representam a visão holística desejável na abordagem da saúde bio-psico-social de todos nós.
É assim, com o maior prazer e expectativa que os convidamos a partilhar connosco, a vossa presença e conhecimentos, no Congresso Multiprofissional e Comemorativo dos 140 anos do Hospital de Dona Estefânia.

Bem vindos.
Bom trabalho

Lisboa, 26 de Junho de 2017

Pela Organização do Congresso
(João Falcão Estrada







TEXTO DO PROFESSOR JOÃO M. VIDEIRA DO AMARAL O PRESIDENTE DO CONGRESSO........PARA OS QUE  AINDA TEM DUVIDAS SOBRE  A IMPORTÂNCIA DA EXISTÊNCIA DOS HOSPITAIS PEDIATRICOS......




O Hospital de Dona Estefânia, a Pediatria Nacional e o Futuro 


L



João M. Videira Amaral - Presidente do Congresso

Foi no ano de 1968 que iniciei as minhas vivências da Pediatria no Hospital de Dona Estefânia (HDE). Vivências que, na minha perspetiva, tipificam as práticas e a evolução duma área da Medicina devotada a Crianças e Jovens, cerca de 20% da população em Portugal.
Ao tempo, no âmbito da Saúde, e não só, o nosso País era considerado de transição, entre subdesenvolvido e desenvolvido. A par duma natalidade traduzida por cerca de 200.000 nados-vivos anuais – garantindo a renovação de gerações – a taxa de mortalidade infantil de 70/1.000, do tipo “terceiro mundo”, envergonhava-nos.
Tendo como pano de fundo o ambiente do “meu hospital”, o que me impressionou logo de início ?
- A dedicação dos Mestres e Colegas mais velhos com quem muito aprendi, a extraordinária perícia e a dedicação das enfermeiras, em número insuficiente, mas cruciais, que faziam milagres e conseguiam canalizar veias de bebés muito pequenos... Para mim um espanto, vindo eu do internato geral de adultos, internato que ao tempo não contemplava a pediatria.
- A elevada prevalência de patologia evitável, exemplificada designadamente por casos de marasmo – os “distróficos” na gíria de então -, kwashiorkor, raquitismo, formas graves de tuberculose, sífilis congénita, sarampo, de tosse convulsa, etc.
- A existência duma enfermaria específica para tratamento de situações de desidratação grave por gastrenterite aguda obrigando a fluidoterapia endovenosa;
- Os internamentos prolongados, os doentes separados da família e casos de hospitalismo. As leis vigentes ainda não contemplavam a presença permanente dos pais junto dos filhos, embora houvesse caso a caso uma boa relação humana médico – doente – família.
O panorama traçado ao de leve consubstanciava globalmente certo grau de atraso do País e uma filosofia de governação com falta de investimento em medidas preventivas, aliados à iliteracia em assuntos básicos da Saúde por parte da população mais desfavorecida.
Felizmente o panorama foi mudando de modo progressivo ao longo dos últimos 45 anos. Houve uma mudança não só política, como económica e social, houve a integração na União Europeia, e o País passou a ser reconhecido pelas instâncias internacionais como desenvolvido.
Com efeito, operou-se largo investimento na área dos cuidados primários (a casa começa a construir-se pela base...), na promoção da saúde, na prevenção de doenças infeciosas, na assistência perinatal, na reestruturação dos centros de saúde, na modernização e ampliação da rede hospitalar, e na educação para a saúde desde a escolas básica. Os frutos da mudança conduziram a uma melhoria expressiva dos indicadores de saúde, espelhando números que contribuem para aumentar a satisfação dos mais pessimistas (e dos políticos...); isto, pelo menos, quanto a mortalidade infantil, que desceu até 2,8/1.000 em 2015, ultrapassando países tradicionalmente na linha da frente e aumentando a autoestima nacional. Contudo, em paralelo com esta melhoria, Portugal não fugiu à epidemia europeia da baixa natalidade: no mesmo ano, menos de 90.000 nascimentos, o que compromete a renovação de gerações.
Todo este esforço foi reconhecido pela Organização Mundial de saúde (OMS), que colocou Portugal em posição destacada na cotação mundial dos melhores sistemas de saúde: o 6º melhor para se nascer entre 80 países com mais de 10 milhões de habitantes, e fazendo parte dos 5 países com melhores resultados em indicadores de saúde na Europa.
Contudo, há que ser realista, pois ao cabo de 45 anos a patologia mudou e todos os que se dedicam à clínica passaram a enfrentar outros problemas, muitos de forte cariz social: a toxidependência, a pobreza e exclusão social em certas bolsas da população, as repercussões do ambiente de stress, de violência, disfunção e negligência familiares, os maus tratos, os efeitos da poluição, a obesidade e excesso de peso com a respectiva comorbilidade, a infecção por VIH, a doença crónica, com múltiplas facetas, e muitos outros. No âmbito das situações mais correntes, os tempos de internamento diminuíram, mas certa patologia mais complexa, passou a levantar a questão da necessidade dos cuidados domiciliários e continuados (inexistentes ou insuficientes para a idade pediátrica).
E no meu Hospital, que é diferenciado e na posição de “fim da linha”, o que mudou quanto à prestação de cuidados, ao ensino, e à investigação?
Eis o que me foi dado protagonizar, com maior representatividade, até à data:
- a preocupação de criar, cada vez mais, ambiente acolhedor e humanista para o doente incluindo a presença permanente da família;
- modernização de estruturas e aquisição de equipamento sofisticado em diversas áreas, em prol da melhoria da qualidade assistencial, auditada a nível internacional;
- criação de unidades de cuidados intensivos neonatais e pediátricos;
- criação e desenvolvimento de uma dezena de subespecialidades pediátricas (a Hematologia foi a primeira) pressupondo implicitamente o desenvolvimento de técnicas específicas e a respectiva valência formativa;
- a criação de centro de simulação em técnicas.
No âmbito do ensino registam-se como mais marcantes os seguintes factos:
– a ligação do HDE à Universidade Nova de Lisboa conferindo o estatuto de hospital universitário desde 1977;
- a formação de pediatras gerais em obediência au programa nacional de internato complementar – hoje chamado de formação específica – que evoluiu de 3 para 5 anos e passou a estar estruturado e diversificado com mobilidade dos internos por diversas instituições incluindo cuidados primários;
- a formação de pediatras com subespecialidades englobando o treino em técnicas e a frequência de ciclos de estudos especiais, desde a neonatologia à gastrenterologia e neurologia;
- o Núcleo Iconográfico, arquivo imagiológico com material de extraordinário valor pedagógico e científico, divulgado periodicamente.
Quanto à investigação, o panorama também mudou muito. Assistimos ao entusiasmo crescente das novas gerações de investigadores realizando estágios em centros nacionais e estrangeiros, e publicando os resultados de estudos em revistas de projecção internacional. Na última década foi criado um centro de investigação e um laboratório de nutrição, realizando trabalho notável de investigação de translação.
Ainda no campo da investigação, indissociável da formação e da assistência, cumpre dar o devido a relevo à organização de eventos científicos, ao Núcleo de Estudos Pediátricos e ao Anuário do HDE, funcionando há quase um quarto de século: repositório de estudos realizados anualmente e ulteriormente divulgados, com atribuição de prémios segundo regulamento.
Falar sobre factos históricos no âmbito do tópico em análise, importa uma referência obrigatória à Sociedade Portuguesa de Pediatria e às suas secções/sociedades satélites, devotadas às subespecialidades pediátricas. Pugnando pela conceção da Pediatria como medicina integral de um grupo etário e considerando a lógica da subespecialização a partir da medicina pediátrica, tem estabelecido pontes com congéneres estrangeiras, e constituído um pilar fundamental para o crescimento e desenvolvimento da Pediatria Nacional, através da sua revista periódica, eventos científicos, cursos, bolsas de estudo, recomendações, etc..
Sobre os Grandes Mestres da Pediatria Nacional a quem presto aqui homenagem, a lista é longa, e fazendo citações de alguns, correria grave risco de omissão de outros. Assim, a minha opção foi referir-me apenas àqueles com quem trabalhei desde os primórdios e me influenciaram na carreira: Nuno Cordeiro Ferreira, M. Elisa Sacramento Monteiro e António Martins Roque.
A propósito do futuro, em tempo do Congresso e em obediência ao título deste escrito, resolvi falar sucintamente sobre o que eu desejo para o HDE, o qual faz parte da Pediatria Nacional.
- Primeiramente, desejo que no futuro o meu hospital se mantenha como instituição autónoma, em ligação estreita a um hospital geral (já estou a perspetivar o futuro Hospital Oriental...) mas com edifício próprio. Questão polémica, mas em prol dos direitos, superiores interesses e bem estar da criança e jovem doentes.
- Mas, se assim coloco esta a questão, tenho que ser coerente: desejo também que no futuro, o HDE, funcionando em rede efectiva, incremente ligações, algumas já realidade, com outras instituições prestando cuidados menos diferenciados, designadamente através da telemedicina (há que tirar partido da tecnologia).
- Desejo que no futuro, em ligação com o hospital, haja condições técnicas e humanas para o desenvolvimento da área de cuidados continuados e de assistência extra-hospitalar, relevando o papel crucial dos profissionais de enfermagem. Tal implica, contudo, incremento muitíssimo significativo de elementos. Considero que tal concretização seria um enorme avanço. O futuro a encarar o problema da doença crónica...
- Desejo que seja repensado e melhorado o processo de transição do doente pediátrico para a medicina de adultos, tendo mais uma vez em conta a importância da doença crónica.
- Desejo que a tecnologia, com seu contributo inestimável para o exercício da medicina, não subalternize paradoxalmente o acto médico clássico, humanista, na relação médico-pessoa.
- Numa fase em que “se sabe cada vez mais de cada vez menos”, desejo que no futuro o subespecialista continue a considerar o paciente como um todo, e a pediatria como uma medicina integral dum grupo etário.
- Desejo que no futuro próximo se incremente a valência do treino contínuo em simulação.

A propósito, costumo citar Oscar Wilde: “Progredir é realizar a utopia”











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