Caros Amigos,
Acabei de ler e assinar a petição: «Revisão da Lei de Bases da Saúde» no endereço
http://peticaopublica.com/
Pessoalmente concordo com esta petição e cumpro com o dever de a fazer chegar ao maior número de pessoas, que certamente saberão avaliar da sua pertinência e actualidade.
Agradeço que subscrevam a petição e que ajudem na sua divulgação através de um email para os vossos contactos.
Os portugueses têm não só o direito como a legítima expectativa de gozar o maior número de anos da sua vida com saúde.
A esperança de vida saudável é um indicador de bem-estar que nos confirma a necessidade de fazer muito mais do que aquilo que tem sido feito, considerando os conhecimentos, as competências e os recursos existentes, a exemplo de outros países europeus com os quais é lícito compararmo-nos, casos de Espanha, França, Itália e Grécia.
Os anos de vida saudáveis representam o objectivo e o indicador mais importante que a política de saúde, seja ela qual for, deve fixar e para os quais é necessário encontrar mecanismos intersectoriais facilitadores da sua concretização.
Os promotores do Manifesto pela nossa saúde, pelo SNS, que reuniu 1001 subscritores, tomam a iniciativa de lançar esta Petição que representa a continuação da tomada de posição expressa naquele Manifesto, articula-se com ele e visa ser apresentada e discutida na Assembleia da República por todos os partidos nela representada.
O objectivo da Petição é a revisão da Lei 48/90, de 24 de Agosto, Lei de Bases da Saúde.
Passados vinte e sete anos, aquela lei exige que seja considerada a nova visão que se tem sobre a saúde, sobretudo na parte da promoção da saúde, da prevenção da doença e da presença da saúde em todas as políticas. Mas também sobre a garantia do acesso aos serviços públicos de saúde, as profissões, os aspectos organizativos do Serviço Nacional de Saúde, o financiamento e a regulação do sector privado.
Com esta Petição, os seus promotores saúdam outras iniciativas e projectos da mesma natureza, contribuindo desta forma para se realizar a discussão que falta fazer sobre política de saúde com vista a melhorar e valorizar o SNS. Não é demais sublinhar que, constitucionalmente, cabe ao Estado garantir a protecção da saúde e a provisão universal de cuidados de saúde a todos os portugueses.
Os promotores desta Petição têm em vista, principalmente, a inclusão dos seguintes aspectos na revisão daquela Lei:
Na promoção da saúde – sendo um processo eminentemente colectivo, deve privilegiar-se a participação de todos os actores sociais da comunidade com implicações directas ou indirectas na sua concretização, contribuindo-se desta forma para o desenvolvimento sustentável da sociedade e dando-se assim expressão prática à Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável, aprovada na sede da ONU, em Setembro de 2015.
Na prevenção da doença – desenvolverem-se estratégias de antecipação da exposição a riscos para a saúde – físicos, biológicos, sócio-laborais e psicológicos -, de controlo dos seus efeitos e de intervenção precoce.
Na saúde pública – garantir o financiamento e os dispositivos legais que permitam às estruturas de saúde pública actuar com total independência do poder político, cumprir os seus objetivos de vigilância da saúde da população e produzir a evidência científica necessária à tomada de decisão.
Na saúde em todas as políticas – este desígnio, aprovado pela Declaração de Adelaide, em 2010, e recomendado pela OMS, significa a adopção de medidas em todas as políticas sectoriais que contribuam para aumentar o impacto positivo sobre a saúde da população.
No acesso - garantia de resposta nos melhores tempos clínicos e nos melhores padrões de qualidade, ajustados ao perfil da gravidade das situações de doença, e abolição dos obstáculos financeiros e geográficos à prestação de cuidados.
Nas profissões – garantir a existência de carreiras profissionais de todos os prestadores de cuidados, em todos os estabelecimentos de saúde, públicos e privados, a sua distribuição ajustada às necessidades em saúde e a remuneração de acordo com a sua diferenciação técnica.
No planeamento – garantir uma equitativa alocação de recursos no todo nacional em função das necessidades identificadas e utilizar as capacidades instaladas de forma a reduzir as assimetrias regionais.
No financiamento – fixar o orçamento do SNS a partir do levantamento das necessidades reais de provisão universal e geral de cuidados de saúde, e institucionalizar a contratualização como instrumento de gestão coerente, confiável e adequado às necessidades de funcionamento dos serviços e dos programas.
Na organização do SNS – criar infraestruturas locais de saúde, de base intermunicipal, que tenham a participação e sejam coordenadas pelos serviços de saúde, a escola, a segurança social e a autarquia, e passem a fazer parte integrante da organização do Serviço Nacional de Saúde.
Na regulação do sector privado – deve ser promovido o cabal cumprimento dos critérios de ordenamento das instituições de saúde, certificação das instituições com base no preenchimento dos quadros de pessoal com a diferenciação ajustados à sua missão, às valências e ao volume de produção previsto, e demonstração obrigatória e pública dos resultados de gerência e do impacto nos indicadores de saúde pertinentes.
Na legislação – atribuir à Assembleia da República o exclusivo de legislar sobre o Estatuto do SNS.
Lisboa, 9 de Outubro de 2017
Os promotores – Adelino Fortunato, Aguinaldo Cabral, Ana Matos Pires, Ana Prata, André Barata, António Avelãs, António Faria-Vaz, António Rodrigues, Armando Brito de Sá, Augusta Sousa, Carlos Ramalhão, Cipriano Justo, Corália Vicente, Daniel Adrião, David Barreira, Elísio Estanque, Fernando Gomes, Fernando Martinho, Gregória von Amann, Guadalupe Simões, Helena Roseta, Heloísa Santos, Jaime Correia de Sousa, Jaime Mendes, João Lavinha, João Proença, Joaquim Lopes Pinheiro, José Aranda da Silva, José Carlos Martins, José Manuel Boavida, José Manuel Calheiros, José Maria Castro Caldas, José Munhoz Frade, Jorge Espírito Santo, José Reis, Luís Gamito, Luísa d’Espiney, Manuel Alegre, Maria Antónia Lavinha, Maria Deolinda Barata, Maria João Andrade, Maria Manuel Deveza, Mariana Neto, Mário Jorge Neves, Marisa Matias, Nídia Zózimo, Paulo Fidalgo, Pedro Lopes Ferreira, Ricardo Sá Fernandes, Sérgio Esperança, Sérgio Manso Pinheiro, Sofia Crisóstomo, Teresa Gago
Pela nossa saúde
A razão de os signatários se dirigirem aos portugueses decorre da
análise que fazem da actual situação no sector da saúde, a qual, quase a
meio do mandato do governo, permanecer sem sinais de mudança que
alterem a natureza do modelo de política de saúde,
promovendo a saúde dos portugueses e reabilitando e requalificando o
Serviço Nacional de Saúde.
O sistema público de saúde carece do financiamento ajustado à sua
missão: promover a saúde, prevenir e tratar a doença. Sem essa condição
não só o SNS vai definhando vendo reduzido um dos seus principais
valores, a cobertura universal, como as respostas
que vai dando são canalizadas quase exclusivamente, e já em condições
precárias, para o tratamento da doença e para contribuir para o
florescimento da prestação privada.
O diagnóstico que melhor caracteriza a saúde da população é dado
pelos seguintes indicadores-chave. (1) com 70% de esperança de vida
saudável (2015), os portugueses tinham o mais baixo valor dos países do
sul da Europa – Espanha, França, Itália e Grécia;
(2) com 32% de esperança de vida saudável aos 65 anos, os portugueses
ficam bastante aquém dos valores daqueles países; (3) no grupo etário
16-64 anos só 58% da população considerava que a sua saúde era boa ou
muito boa, quando na Grécia ou em Espanha é superior
a 80% (2015); (4) no grupo com mais de 64 anos aquela percepção é de
12%, sendo em Espanha e França superior a 40%; (5) mais de 50% da
população tem excesso de peso; (6) em 2016 verificou-se o maior excesso
de mortalidade da década, correspondente a 4 632
óbitos.
Nos setenta e sete hospitais da rede pública, cerca de 800 000
utentes aguardam com excesso de espera uma primeira consulta hospitalar,
correspondendo a 30% das primeiras consultas realizadas em 2016. Esse
excesso varia entre 2 e
>800
dias. Mais de oitocentos mil portugueses não têm médico de família
atribuído. Entre 2014 e 2016 verificou-se um aumento de 529 000
urgências. Em seis anos (2009-2015) a despesa
pública da saúde diminuiu quase dois mil e quinhentos milhões de euros,
tendo passado de 6,9% para 5,8% do PIB.
Esta situação é já bastante preocupante. Continua a insistir-se
num modelo de política de saúde exclusivamente orientado para o
tratamento da doença e centrado nas tradicionais instituições de saúde.
Quando a regra é ser-se saudável e a excepção é estar-se
doente, a quase totalidade dos recursos são canalizados para a
excepção, embora a promoção e a protecção da saúde sejam as intervenções
que mais contribuem para melhorar o bem-estar das pessoas e das
comunidades, e a estratégia que torna os sistemas de saúde
sustentáveis. Do que se trata, por isso, não é de medidas avulsas que
dificilmente se articulam entre si, mas de uma reforma que integre
cuidados hospitalares, cuidados continuados, cuidados de saúde primários
e intervenções em saúde pública que inclua os
actores formais e informais das comunidades locais e que incorpore o
melhor conhecimento científico disponível.
Mas mesmo quando se trata da prestação de cuidados na doença, as
limitações ao acesso mantém-se como o maior obstáculo aos serviços de
saúde no momento em que são necessários, com as consequências negativas
daí decorrentes para a condição dos doentes.
Os tempos de espera inadmissíveis são disso a melhor evidência e o
crescimento da afluência às urgências o pior sintoma da disfunção que
reina no sector.
No que se refere ao sector privado exige-se que a sua regulação se
faça do lado do cumprimento de critérios de ordenamento das
instituições de saúde, que a certificação inclua o preenchimento dos
quadros de pessoal com a diferenciação ajustados à sua
missão, às valências e ao volume de produção previsto, e que a
demonstração dos resultados de gerência sejam obrigatórios e públicos.
As várias greves do pessoal da saúde – médicos, enfermeiros,
técnicos de diagnóstico e outros trabalhadores -, em que se verificou
tanto uma grande adesão desses profissionais como uma considerável
compreensão por parte da população, representam sinais
que devem ser entendidos e interpretados como manifestações críticas da
situação que se está a viver no sector.
Os signatários deste Manifesto têm uma longa história de serviço
público no Serviço Nacional de Saúde e de dedicação à causa da saúde
pública. A maior parte deles contribuiu para que ele se implantasse nos
primeiros anos da sua criação, foram seus profissionais
empenhados desde então e bateram-se por diversas vezes contra os
ataques que lhe foram movidos. Não estão, por isso, dispostos a assistir
ao seu progressivo definhamento. Se, como é defendido, o SNS representa
um dos mais relevantes serviços que a democracia
tem prestado aos portugueses, então há que proceder à mudança que se
impõe da política de saúde. Passados 38 anos da sua criação, o SNS não
pode ficar imóvel e alheio aos desafios que lhe são colocados. Nesta
exigência estamos acompanhados pelos mais prestigiados
peritos na matéria, como Ilona Kickbusch, David Gleicher e Hans Kluge da OMS, e Nigel Crisp,
coordenador da Plataforma Gulbenkian Health in Portugal.
Por isso nos dirigimos também a todas as organizações partidárias
que subscreveram os acordos de 10 de Novembro de 2015, na expectativa de
que sejam sensíveis a esta necessidade inadiável e tomem as decisões
que a situação descrita exige. Esta política
de saúde já mostrou que não está a responder ao que é exigido de um
governo que se afirma empenhado em dar uma orientação de esquerda às
suas políticas sociais. Está, por isso, nas mãos da actual maioria
parlamentar iniciarem o processo de mudança da política
de saúde.
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