terça-feira, 8 de janeiro de 2019

MANIFESTO DA TOTALIDADE DOS DIRECTORES DAS AREAS CLINICAS DO CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL CONTRA A DESTRUIÇÃO EM CURSO DOS HOSPITAIS CIVIS DE LISBOA , QUE CONSTITUIRÁ UMA PERDA IRREPARÁVEL ( ENTRE OS QUAIS O HOSPITAL PEDIATRICO DE LISBOA)




Manifesto

Os signatários constitueem a totalidade dos Directores das Áreas Clínicas, e Responsáveis de Especialidade do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, herdeiro directo dos Hospitais Civis de Lisboa, criados em 1913. Nos Hospitais que constituíram esse grupo funcionaram a Régia Escola de Cirurgia de Lisboa (1825) a Escola Médico – Cirúrgica de Lisboa (1836) o primeiro Hospital Pediátrico do país (Hospital de Dona Estefânia 1877) a primeira Maternidade construída de raiz (Maternidade Dr. Alfredo da Costa 1932), e o mítico Banco de S José, aberto ao público desde há 500 anos, e durante séculos o único responsável pela assistência médico-cirúrgica de urgência em Lisboa e na quase totalidade do sul do país. Pode, pois, dizer-se que os Hospitais Civis de Lisboa foram o berço da Medicina, da Cirurgia, da Pediatria e da Obstetrícia portuguesas.
Ao longo destes últimos anos alertámos através de cartas e ofícios, dirigidos às estruturas hierárquicas, para os constrangimentos vários que impediam a realização da nossa principal função : assistência de qualidade aos doentes que nos procuram. A ausência sistemática de respostas cabais aos nossos pedidos, fazem-nos sentir ser chegado o momento de trazer à consideração superior e ao conhecimento público o seguinte:

1.      É por todos os signatários, e por largo consenso, hoje reconhecida a elevada degradação das condições de trabalho no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC). Degradação que envolve a dotação de pessoal médico, de pessoal técnico e de enfermagem, a disponibilidade de material de consumo, a introdução de equipamento especializado, o investimento na inovação, e a mera  logística para o normal exercício profissional. O trabalho diário passou a gestão permanente de crises.
2.      Entendem estes responsáveis médicos do CHULC estar agora seriamente comprometida a sua dupla capacidade de prestação assistencial e de treino médico.  Ambas componentes essenciais, quanto indissociáveis do seu mandato profissional   e integrantes do contrato entre a Profissão e a Sociedade - materializadas nos valores do Profissionalismo Médico.
3.      Esta degradação tem vindo a instaurar-se ao longo dos últimos anos, assumindo diversas matizes, tais como a progressiva perda de autonomia na gestão, a incapacidade de influenciar o desenvolvimento tecnológico dos serviços ou, mais recentemente,  a capacidade de reter talentos profissionais emergentes.  Este facto afecta o presente, e compromete gravemente o futuro.
4.      Acham os signatários ser seu dever, no âmbito do mandato de advocacia da Saúde, e no primado da defesa dos  doentes, vir agora a público denunciar esta grave situação, situação que compromete já hoje a segurança clínica, e não menos compromete a capacidade formativa dos que, por nós ensinados, deveriam assegurar a nossa própria continuidade. Esta é também uma inalienável responsabilidade Hipocrática.
5.      É que para além da deterioração das condições de trabalho acima referidas, com riscos para quem mais interessa, os doentes, esta situação comprometerá no curto prazo a capacidade assistencial, levando ao encerramento de serviços, a começar pelos das diversas Urgências que o Centro Hospitalar disponibiliza, por falta de condições mínimas, ou ausência mesmo de quaisquer condições de elementar segurança para o seu normal funcionamento. É que se contam já por muitas, as valências altamente diferenciadas,  hoje perdidas pelas mais diversas especialidades. De forma silenciosa, mas com prejuízo insubstituível para os doentes e para a Sociedade.
6.      Num tempo em que as palavras duram o tempo que soam e valem pouco mais do que isso, acham os signatários deste manifesto ser seu dever ético, pessoal e profissional, alertar agora para a gravidade das condições de trabalho no CHULC, condições que a todos afectam hoje, e que comprometerão amanhã o futuro que é de todos.  
Para que conste e para que se saiba, e para que possam, se for ainda  tempo,  vir a ser melhoradas... Mas também para que não se diga que ficámos silenciosos, que fomos cúmplices desta clamorosa destruição do Serviço Nacional de Saúde, um Serviço que tantos brandem como bandeira, mas que, outros tantos, senão os mesmos, por inacção ou omissão, conduzem à implosão.