domingo, 24 de outubro de 2021

AINDA É TEMPO DE CORRIGIR UM ERRO ! Uma proposta a analisar.

 Recebemos este texto por mail,. Por lapso de quem o enviou . não veio acompanhado da ultima pagina  com a  identificação do autor, falha que corrigiremos logo que possivel. 

Tratando-se de uma proposta  bem fundamentada e  que independente da nossa opinião  merece estar em cima da mesa e analisada conjuntamente com as outra  que  ao contrario desta, se encontram encerradas nos gabinetes.,,,,,

"Carta Aberta ao Sr. Primeiro-ministro

 

Ainda é tempo de corrigir um erro!

 

Vem de longe a ideia de reunir num só os chamados “hospitais civis de Lisboa”. Hoje são 6, a Maternidade Alfredo da Costa (MAC), o Hospital Dona Estefânia (HDE), Hospital Curry Cabral (HCC), Hospital Santo António dos Capuchos (HSAC), Hospital de Santa Marta (HSM) e Hospital de São José (HSJ). Funcionalmente reunidos no Centro Hospitalar de Lisboa Central (agora universitário-U) (CHULC), estes seis hospitais são pilares da saúde em Lisboa e foram palco de importantes páginas da saúde, da ciência e da história de Portugal, uma das quais foi a realização da primeira angiografia por Egas Moniz (no Hospital de Santa Marta, então ligado à faculdade de Medicina). Houve também momentos dramáticos, como o socorro a Miguel Bombarda no dia do seu assassinato em 3/10/1910., ou com simbolismo religioso como a morte de Jacinta Marto (posteriormente canonizada) em fevereiro de 1920 no HDE.

A estes seis hospitais não se junta hoje o “braço” Psiquiátrico, o Hospital Miguel Bombarda, porque foi, entretanto, extinto em 2010, razão pela qual não há hoje neste conjunto um serviço de Psiquiatria (foi também extinto o Hospital do Desterro onde havia um importantíssimo serviço de dermatologia, hoje no HSAC e o hospital de São Lázaro, com a Ortopedia, hoje no HCC). Apesar de tudo o que aconteceu, entretanto, este é ainda um centro hospitalar munido de todas as áreas da medicina, com avançada tecnologia, e profissionais muito qualificados e experientes, fruto não só da formação médica em Portugal, mas também de uma continuidade histórica centrada na clínica e na passagem de conhecimentos ao longo de gerações de médicos e enfermeiros.

Neste centro hospitalar existem 3 urgências abertas 24 horas por dia, 365 dias por ano, ou seja, de ginecologia-obstetrícia (MAC), de pediatria (e respectivas subespecialidades- HDE) e de adultos (também com as suas especialidades-HSJ). Pode dizer-se que, contando com a continuidade temporal com o histórico Hospital de Todos os Santos, a urgência está aberta desde os descobrimentos no século XVI. A mudança fez sempre parte deste conjunto de hospitais, assim como a sua capacidade de, mais do que acompanhar, ser motor de avanços científicos e médicos. Lembramos o nascimento, ainda recente, de um bebé de uma mãe longo tempo sustentada em morte cerebral, um dos poucos casos no mundo ou as centenas de transplantes de fígado, rim, coração e pulmão que aqui têm lugar. Nem sempre é perceptível pelo público a complexidade e importância do que se faz nesta enorme instituição.

            Estando há anos em curso um processo de fusão de instalações, com avanços e recuos, pensamos que uma resolução responsável deste processo será fundamental para a saúde não só na cidade de Lisboa, mas também do país, pois como centro de referência, aqui são recebidos doentes de todo o continente e ilhas e, particularmente no HDE, muitos provenientes dos PALOP.

A solução até agora proposta tem sido o simples encerramento dos hospitais e a sua fusão num só, o agora chamado Hospital de Lisboa Oriental, visto que o nome originalmente proposto o de Hospital de Todos os Santos , com ressonância histórica e agregativa, teve de ser sacrificado por displicência do Ministério da Saúde na litigação com entidade privada. (ver imagem 2). Esta solução parece-nos perigosa e insuficiente. Perigosa porque a concentração num só edifício de uma realidade médica complexa e muito extensa irá retirar a elasticidade e a capacidade de adaptação que estes 6 edifícios têm proporcionado ao centro hospitalar. Recordamos que o CHULC tem uma capacidade harmónica, isto é, de aumento de camas, bastante grande e que, com a pandemia Covid-19, foi fundamental não só para poder responder à brutal procura de camas de cuidados intensivos e de enfermaria, mas também contar com espaços livres e separados fisicamente entre si para poder conter o contágio do vírus dentro da instituição. Não deixa de ser paradigmático que, em instalações que se pensavam já dispensáveis, foi no quase defunto Hospital de São Lázaro que foi possível montar o atendimento Covid-19 de ambulatório ou vacinar mais de 800 profissionais de saúde num só dia!

Perigosa ainda porque sabe que, em caso de sismo, será mais prudente ter instalações suficientes com diversos edifícios do que estar confinado a apenas um numa zona periférica da cidade. Outras calamidades, quer sanitárias quer ambientais, podem, no médio e longo prazo, surpreender-nos. O centro hospitalar será sempre chamado a estar na “linha da frente” de todos esses combates.

Não ignoramos os custos de manutenção e transporte actualmente existentes entre edifícios. Por isso, pensamos que a solução mais inteligente, mais duradoura e mais segura seria manter o hospital Dona Estefânia, aproveitar o terreno e alguns edifícios do Hospital Miguel Bombarda para fazer um centro de ambulatório onde os acessos de transportes são acessíveis para o doente, e recorrer ao terreno hoje da Academia Militar (AM) (contígua ao HDE e HMB) para a construção da componente de internamento e urgência de adultos, incluindo uma Maternidade. A proximidade entre estes três espaços (ver imagem 1) permitiria abrir corredores de circulação, eliminando os custos de transporte (uma das principais queixas das administrações), manter o hospital Dona Estefânia e a sua mais valia para a saúde infantil em Portugal, e ter uma urgência de adultos e respectivos serviços hospitalares num terreno grande, o da academia militar, com bons acessos e heliporto, separados da zona de ambulatório (o que traria vantagens logísticas e epidemiológicas) por uma rua (a rua Dona Estefânia). Esta solução permitiria ainda manter o hospital junto da Faculdade de Ciências Médicas, ao qual está ligado, como grande centro universitário. A ligação entre a maternidade e o HDE , separados por uma rua (rua Jacinta Marto) permitiria finalmente recriar um importante polo materno-infantil. A proximidade com a faculdade (há poucos anos com um conjunto renovado de edifícios e biblioteca) é vital para o progresso científico da saúde num dos maiores hospitais do país. Além de tudo isto, a questão fundamental do número atual de camas, cuja redução prevista para o hospital de Lisboa Oriental trará problemas insolúveis à gestão dos recursos de saúde na cidade de Lisboa, ficaria também resolvida. Tão importante como o número absoluto das camas é a especificação das mesmas. A nova estrutura hospitalar programada não responde à emergência de situações pandémicas, pois não tem nem vocação nem muito menos espaço para albergar e isolar serviços de infeciologia com a dimensão dos atuais nos hospitais HCC e HDE. Seria também avisado manter pelo menos parte dos edifícios e terreno envolvente do HCC como reserva para as tais situações epidemiológicas extremas – pandemias- ou catástrofes naturais.

Lembramos que a ideia de retirar hospitais do centro das cidades já teve o seu tempo. Por exemplo, em Paris o Hôtel Dieu não fechou. Madrid, Roma, Barcelona, Londres , Berlim são também cidades europeias em que grandes hospitais centenários e localizados no seu centro urbano não foram encerrados , pelo contrário têm beneficiado de obras de rejuvenescimento. Seremos nós melhores planificadores que as autoridades de saúde e municipais desses países? Ou seremos nós que estaremos a ir a contra-ciclo, tomando decisões irreversíveis, com prejuízo para a saúde dos nossos cidadãos? Acrescentamos, ainda, que os terrenos do HDE foram destinados legalmente à saúde infantil. Sabemos que existem diversos interesses em conflito no espaço urbano, desde logo actividades turísticas, habitação e serviços sobre os quais não nos pronunciamos. Contudo, estando em curso em Lisboa a retirada de instalações militares do centro da cidade, uma troca de terrenos com o Ministério de Defesa abriria a possibilidade de haver melhorias muito grandes para a saúde de todos, mantendo-se o terreno do agora futuro hospital oriental disponível para a construção de habitação,  (a que entretanto foi anunciada para ser feita no terreno do hospital Miguel Bombarda), e ainda, enormes áreas e edifícios para destinos vários em todos os outros hospitais a desocupar: MAC, HSJ, HSAC,  HSM e uma parte do HCC .

Senhor Primeiro-ministro apelamos ao seu sentido de estado e à natural vontade de deixar um legado duradouro aos portugueses. A construção de uma unidade hospitalar com esta dimensão, correspondente á que foi a do Hospital Santa Maria na década de 50 para o Estado Novo, não pode estar envolta em secretismo dentro de gabinetes dos ministérios da Saúde e das Finanças. Tem de ser debatida por todos os interessados, profissionais, utentes, munícipes e autarcas. Não há memória num país desenvolvido e democrático em que isto não tenha acontecido.

Se isso tivesse acontecido desde a génese do processo, seguramente não estaríamos aqui , mas nunca é tarde para corrigir um erro, depois será tarde de mais e ninguém ficará a ganhar."

 

 

Figura 1 : imagem aérea do terreno do HMB, Academia Militar e HDE

 

 

 

Imagem 2: terreno do futuro hospital de Lisboa Oriental.

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